sexta-feira, 22 de maio de 2015

Incabível



Embora eu sempre tenha sido uma criança muito sonhadora e imaginativa, nunca acreditei no amor romântico. Nunca acreditei fielmente que dois seres poderiam se entrelaçar, se apaixonar e viver algo concreto. Talvez pelo fato de conviver com um casamento fracassado. Ou então porque sempre senti tudo de maneira diferente.
Conseguia amar o tempo, o sol, as janelas, a forma como o vento dobrava as cortinas, o poema, a música, os pequenos sons na madrugada, o sábado de manhã... Conseguia amar o que via porque a frente dos meus olhos havia um filtro que transformava tudo numa causa. A vida era uma dança e eu amava assistir suas voltas.
Triste, melancólica e profunda. De uma beleza rara. Como devia ser.

Não amava pessoas.
Nunca consegui amar pessoas.
Amava o que elas eram, de longe, fora do meu círculo de contato. Amava observa-las.

Sempre fui muito solitária.
Mas tudo bem. Estava entretida com alguma coisa que fisgara meu olhar. E dessa forma eu era plena.

As pessoas são caricaturas que cabem muito bem nas minhas telas imaginárias e lá elas são límpidas, belas, complexas... Poderia admira-las pra sempre. Meu talento nunca foi toca-las. E não é até hoje.

Quando te vi pela primeira vez, seu olhar baixo e seus braços que procuravam uma posição confortável me prenderam. Você estava ao redor dos meus, tudo me era muito familiar, menos o seu cheiro.
Passei 7 dias tentando te decifrar e eu não conseguia entender porque tudo era tão simples... tão fácil... tão sem mistérios. Isso me intrigava e ao mesmo tempo me deixava desinteressada.

Crescemos juntos.
Porque se até então me aproximar era difícil, com você era diferente. As pessoas me eram inacessíveis, mas você nao hesitou em entrar no meu mundo como se toda aquela camada protetora fosse de sabão.
Aprendi a te amar sem precisar te observar.
Aprendi a me amar sem precisar me ajustar.

Eu te amo.

Embora eu sempre tenha sonhado com caminhos menos dolorosos e mais serenos, a complexidade parecia gostar do meu abraço. E eu também gostava do dela.

Há um preço que se paga por amar. Principalmente se você é um alguém que ama a vida e nao as pessoas, por mais que você tente, elas nunca serão suficientes. De perto, todos somos muito tortos e errados, como posso viver olhando pra essa goteira que derrete toda a tinta do meu quadro? Como posso me acostumar com um amor que queima o que me conforta? Como posso me confortar com o que me queima? Como posso te amar se pra mim você não é um mistério? Eu preciso ficar longe! Te eternizar! Te fazer belo! Te observar! Não te tocar.
Preciso ficar longe.

Não consigo me decidir.

Não sei se quero me curar. Não sei se quero ir sentir o mundo ou se desejo apenas observar de onde sei que tudo é perfeito.

Talvez se eu tivessse sido uma criança menos sonhadora e imaginativa, eu teria aprendido a viver num mundo que realmente existe.
Eu não estaria presa nesse que me faz deletar a única prova de que minhas crenças não representavam a verdade em que me encontrava e que me encontro 20 anos depois.

Não me apego a essa existência mesquinha onde me privo das verdades afim de ter conforto. Porém o que sinto não me deixa mentir: Sou incabível.

Devo enterrar o único espaço que me abriga? Ou esperar minha morte compreendendo que amar não é uma ilusão?

De tudo o que ja amei, você é o tempo, o sol, as janelas, a forma como o vento dobra as cortinas, o poema, a música, os pequenos sons na madrugada, o sábado de manhã...
Transformo-te em vida, pois assim não preciso te perder.

Pessoas?
Não, nunca consegui amar pessoas.
Apenas causas.
Elas são simples... fáceis....sem mistérios... Plenas.

sábado, 14 de março de 2015

W.R.O.N.G

Eu nasci com o signo errado
Na casa errada
Com o ascendente errado
Eu segui o caminho errado
Que me levou a tendências erradas
Eu estava no lugar errado, na hora errada
Pelo motivo errado e na rima errada
No dia errado da semana errada
Usei o método errado com a técnica errada

Há algo de errado comigo quimicamente
Algo de errado comigo inerentemente
A mistura errada nos genes errados
Eu alcancei os fins errados pelos meios errados
Era o plano errado nas mãos erradas
A teoria errada para o homem errado
Os olhos errados no prêmio errado
As perguntas erradas com as respostas erradas

Eu estava seguindo os princípios errados
Com a escória errada
Extravasando a energia errada
Usando todas as linhas erradas
E os sinais errados
Com a intensidade errada
Eu estava na página errada do livro errado
Com a versão errada do olhar errado
Com a lua errada, toda noite errada
Com a música errada tocando até que soasse certa

Errado
Muito tempo
Errado

(Wrong - Depeche Mode)